A proposta de legalização do lobby em Angola, defendida pelo Dr. Carlos Feijó, merece uma análise crítica aprofundada, pois, longe de representar um avanço democrático, ela pode consolidar práticas nocivas já enraizadas no tecido político e econômico do país.
O lobby, quando regulamentado em democracias consolidadas como os Estados Unidos, Canadá ou países da União Europeia, desempenha um papel legítimo na representação de interesses perante os decisores políticos. No entanto, essa funcionalidade só se efetiva porque essas sociedades possuem instituições robustas, independentes e dotadas de mecanismos eficazes de fiscalização e responsabilização. O lobby nesses contextos é regulado, monitorado e transparente, garantindo que os interesses privados não se sobreponham ao bem comum.
Em Angola, a realidade é profundamente distinta. O país enfrenta desafios estruturais sérios, como a debilidade das instituições, a falta de independência dos órgãos de fiscalização, o compadrio político e elevados índices de corrupção. A legalização do lobby num ambiente como este não resultaria em transparência, mas sim na institucionalização da influência oculta e da captura do Estado por interesses privados.
O primeiro grande problema reside na ausência de instituições suficientemente fortes para regular e fiscalizar a atividade do lobby. Num país onde o tráfico de influências já ocorre de forma descontrolada, dar-lhe um manto de legalidade significaria apenas criar uma via formal para que grupos económicos e políticos dominantes exerçam ainda mais influência sobre as decisões governamentais, sem qualquer escrutínio real.
Aumento da Corrupção e do Compadrio.
Se num ambiente institucionalizado o lobby pode ser um canal legítimo de defesa de interesses, num contexto como o angolano, onde a corrupção já mina as estruturas do Estado, ele se tornaria um mecanismo oficial para a compra de favores e decisões políticas, o risco de que a legislação sobre lobby seja usada para justificar o desvio de fundos públicos, a atribuição de contratos de forma pouco transparente e a perpetuação de redes clientelistas é demasiado alto para ser ignorado.
Desigualdade no Acesso ao Poder
A legalização do lobby beneficiaria essencialmente as elites políticas e os seus familiares, bem como as elites empresariais, que já controlam os principais setores da economia e têm acesso privilegiado aos decisores públicos, Assim sendo, a sociedade civil, as pequenas e médias empresas e os cidadãos comuns continuariam excluídos do processo de tomada de decisões, aprofundando ainda mais as desigualdades e a concentração de poder.
Um Obstáculo à Credibilização do Estado
Angola precisa urgentemente de fortalecer as suas instituições, melhorar os mecanismos de transparência e criar uma cultura de prestação de contas. Legalizar o lobby neste momento seria um retrocesso, pois consolidaria a percepção de que as decisões políticas podem ser influenciadas por interesses financeiros, em vez de serem tomadas com base no mérito e na necessidade coletiva.
O Timing é Fundamental: Agora Não!
A legalização do lobby pode ser uma questão a considerar no futuro, mas somente quando Angola alcançar níveis satisfatórios de transparência e fortalecimento institucional. Neste momento, qualquer tentativa de introduzir um regime jurídico para o lobby equivaleria a legalizar a “micha” e a institucionalizar a corrupção sob um novo nome.
O país precisa primeiro de garantir que as suas instituições são mais fortes do que os indivíduos que as lideram, somente quando houver uma cultura de integridade, fiscalização rigorosa e responsabilização efetiva é que se poderá discutir seriamente a legalização do lobby como um mecanismo legítimo de participação política e empresarial. Até lá, essa proposta não passa de um risco elevado e de uma distração perigosa num país que ainda luta para consolidar a sua democracia e credibilizar suas instituições.
Nadilson Paim- Jurista e Professor Universitário