“Quando tens 10% dos destinatários a não cumprir as regras há que reforçar a repressão; quando tens 90% dos destinatários a não cumprir as regras, tens de mudar as regras”, diz Heitor Carvalho, director do Cinvestec. Exigências “absurdas” empurram microempresários para a informalidade.
Num mercado com elevada mortalidade empresarial, onde “apenas 2% das empresas mantidas permanecem formalmente activas”, o Centro de Investigação Económica da Universidade Lusíada de Angola (Cinvestec) defende uma reforma tributária que “simplifique e facilite o pagamento de impostos” no caso das micro e pequenas empresas e que reduza a carga tributária para as empresas de média e grande dimensão.
No caso das micro-empresas e micro-negócios, o Cinvestec propõe que o “relacionamento com a AGT se limite a um pagamento mensal electrónico”, através do multicaixa ou outros meios de pagamento, com uma taxa sobre a actividade ou uma prestação fixa mensal por Código de Actividade Económica (CAE) ou tipo de micro-negócio. “Estes pagamentos devem ser tidos como declarações de actividade e os comprovativos bancários como prova de pagamento e cumprimento das obrigações declarativas naquele mês”, esclarece Heitor Carvalho, director do Cinvestec.
Desta forma, a Administração Geral Tributária (AGT) estará a contribuir para a formalização dos micro-negócios, uma vez que quem os promove necessita de uma “tributação simples e sem qualquer burocracia”, caso contrário opta por manter-se na informalidade.
“É crucial proteger os negócios informais, garantindo vantagens perceptíveis ao pagar impostos em vez de ceder a “mixeiros””, lê-se no Relatório Económico do 1.º Semestre de 2024, divulgado no final de Novembro. Os “mixeiros” a quem o Cinvestec se refere incluem “todos os que se dediquem a extorquir pelas mais variadas formas as pessoas e os negócios”. Contam-se entre eles, fiscais municipais, agentes da polícia, inspectores da Aniesa e até da AGT, loteadores, “donos” de placas, entre outros.
Heitor Carvalho explica que todos os negócios informais pagam “impostos” a “mixeiros”, pelo que “formalizar a economia é também colocar uma boa parte da informalidade a pagar impostos ao Estado (menores do que são cobrados pelos “mixeiros”) e ter, em contrapartida, a protecção do imenso aparelho repressivo do Estado”. Segundo o director do Cinvestec, o “aparelho repressivo é muito útil”, mas só “se estiver virado para o lado certo”.
Intolerância aos “mixeiros”
Mas isso implica a “coragem de ser completamente intolerante perante qualquer actuação para benefício próprio ou apatia ou colaboração dos agentes do Estado com os “mixeiros” ou qualquer exigência aos negócios que não conste de uma lista pública de obrigações de cada micro- -empresa ou micro-negócio”, defende Heitor Carvalho. Estas listas devem ser feitas para “todos os CAE e tipo de micro-negócios, por cada ministério sectorial, mas sob a égide do ministro de Estado para a Coordenação Económica, de tal forma que as exigências sejam compatíveis com os rendimentos actuais dos angolanos”.
Segundo o director do Cinvestec, o que se verifica hoje é a existência de “exigências absurdas, que nem nos países avançados são cumpridas e, como resultado, quase todos os produtos da formalidade estão fora do alcance dos angolanos”. “Apesar dos problemas do fisco, é sobretudo esta questão que empurra as empresas e negócios de todas as dimensões para a informalidade”, conclui Heitor Carvalho, uma vez que “produzir em Angola, cumprindo as regras da formalidade, é mais caro do que aquilo que os angolanos podem comprar”. Num artigo publicado no Expansão, a 22 de Novembro, Heitor Carvalho e Agostinho Mateus recordam que a AGT há mais do que uma década promete um sistema tributário para as micro- -empresas.
Contudo, a autoridade tributária “nada tem feito para o criar”, quando um sistema deste tipo “pode ser implementado em seis meses e aperfeiçoado em funcionamento”. Paralelamente à criação de um sistema para as micro-empresas e os micro-negócios, as pequenas, médias e grandes empresas “devem ter a sua carga fiscal reduzida para serem mais competitivas” e para que o Estado aumente os seus rendimentos através da extensão do número de contribuintes fiscais.
Asfixiados por impostos
O que se verifica em Angola, e é queixa corrente, é a “asfixia” das empresas por impostos draconianos, sobretudo desde que a máquina de arrecadação fiscal foi afinada, com a entrada em vigor do IVA, que veio impor, gradualmente, a submissão electrónica de todos os impostos.