3,7 mil milhões USD “desviados” por corrupção para nações ricas

Baseada em decisões judiciais e alegações credíveis de corrupção e ocultação de riqueza em offshores, a Transparência Internacional traça os principais destinos do dinheiro “roubado” pela corrupção em África. Em Angola, o foco recai em Carlos São Vicente e Isabel dos Santos.

Isabel Costa Bordalo

“Imaginem milhares de milhões de dólares desviados de fundos públicos – dinheiro destinado à construção de escolas, hospitais e infra-estruturas – a desaparecer nuта rede de contas offshore, imóveis de luxo e empresas de fachada. Isto não é ficção; é a dura realidade de como a corrupção drena recursos de África e de outras regiões, deixando as pessoas a suportar os custos.”

É desta forma que a Transparência internacional (TI) resume uma pesquisa, baseada em 78 casos, envolvendo um total de 375 activos, no valor de 3,7 mil milhões USD, espalhados por 74 jurisdições, através de uma teia complexa, que em Angola “apanha” o empresário Carlos São Vicente e Isabel dos Santos, filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos. Dois casos que servem para ilustrar como Pessoas Politicamente Expostas (PEP) utilizam empresas e holdings para promover os seus próprios interesses comerciais. “Trata-se de empresas com negócios legítimos, muitas vezes a operar nos seus países de origem, aos quais não desejam estar associados”, o que ajuda a “ocultar possíveis conflitos de interesse ou facilitar esquemas de corrupção”, explica a Tl, organização que todos os anos mede a percepção de corrupção em 180 jurisdições.

Apesar da dimensão, estes números representam a “ponta do icebergue”, uma vez que incluem apenas activos identificáveis através de fontes públicas, o que leva a Tl a insistir na necessidade de os países exigirem que “todos os activos, incluindo entidades jurídicas [empresas], contas bancárias, propriedades, obras de arte, veículos e iates, sejam registados junto de uma autoridade governamental”.

Os governos devem também exigir que os profissionais dos sectores financeiro e não financeiro, cujos serviços são cruciais para ocultar activos ilícitos no estrangeiro, estejam sujeitos às regras de combate ao branqueamento de capitais e que tenham um nível de escrutinio elevado, devendo enfrentar “repercussões graves”, incluindo perda de licença e sanções criminais.

“Os países devem implementar e utilizar mecanismos civis e criminais para apreender e confiscar bens”, devendo também agir no sentido de “repatriar fundos em beneficio das vítimas de corrupção”, defende a Transparência Internacional, na investigação “África: Esconderijos do dinheiro Ilícito – Como desaparecem os fundos de corrupção no estrangeiro”.

O “novo lar” do dinheiro roubado

Perto de 80% dos activos “roubados ou ocultos de África” estão no estrangeiro, “muitas vezes longe do local onde a corrupção ocorreu”. Ao seguir o rasto do dinheiro, a Transparência Internacional traça o mapa do “novo lar” desses fundos, mas também os “mecanismos e ferramentas utilizadas para os ocultar”. A Namíbia é o único entre 11 países africanos analisados onde os activos desviados não saem do país. No caso de Angola, saem através de pessoas colectivas registadas na Ilha de Man, EUA e Malta, que depois os dispersam ou aplicam no Reino Unido, Portugal e Mónaco.

As Ilhas Virgens Britânicas, o Panamá e as Seicheles são os principais centros de incorporação de empresas anónimas utilizadas para ocultar activos e fundos roubados. No caso do imobiliário, França, Reino Unido, Emirados Árabes Unidos e EUA aparecem como “destinos principais de contas bancárias utilizadas para pagar subornos, movimentar ou armazenar fundos provenientes da corrupção”. E Hong Kong, Suíça, Reino Unido, Emirados Árabes Unidos e EUA são os “principais destinos das contas bancárias utilizadas para pagar subornos, movimentar ou armazenar fundos ilícitos”.

A informação detalhada sobre as contas bancárias “limitou-se apenas a 43 dos 78 casos analisados”, esclarece a TI, sugerindo que o número real de contas envolvidas é muito mais elevado.

As conclusões da investigação ilustram a dimensão do desafio, “especialmente quando os principais centros financeiros não conseguem implementar medidas eficazes de combate ao branqueamento”. A Transparência Internacional dá como exemplo o facto de os reguladores suíços informarem em 2023 que 50% dos bancos inspecionados tinham sistemas antibranqueamento de capitais “amplamente insatisfatórios”.

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